Proposta: o personagem tem uma mania (ou idiossincrasia), muito imprópria para a situação em que está.
Antes de dormir (Lucimar Bello)
Ele, viajante e hospedado no Hotel das Letras, em Lisboa, recolhe os jornais do dia. Muitos. Antes de dormir. Entulha todos na lixeira do lavabo.
Ele, noutra viagem, no Hotel das Palavras, em Minas Gerais, agrupa os jornais lidos. Toda noite. Antes de dormir. Coloca um a um embaixo do tapete, no saguão de entrada.
Ele, na terceira viagem, no Hotel das Estrebarias, na Patagônia, coleta os jornais tardios Nem lidos. Enfia embaixo das patas dos cavalos, noite adentro.
Ele viaja,
La vie en rose (Raquel Pais)
Chegara finalmente para identificar o corpo. Sobrinha eleita. A que vivia mais perto, e a tia privilegiava essas praticidades.
O médico destapou a tia, juraria que nos filmes era uma bolsa plástica rígida, um plástico atoalhado branco. Assim que viu a testa assentiu, o bico de viúva, o sinal sobre a sobrancelha, era ela. Era a tia Luísa.
Assine então no final depois de ler o documento, estendeu a caneta azul guardada na bata. Pediu que a esperasse.
Abriu a bolsa repleta de kleenex, uma carteira enorme, o bilhete único solto sobre as lágrimas. Dê-me um segundo… Pegou um estojo, infantil, desses de loja chinesa e catou uma caneta rosada. O médico viajou quando viu a Betty Boop. Há anos que não se encontrava com essa bonequinha dançante.
Destapou a tampa. O bico da caneta deslizou sobre a folha, palavra por palavra. Sublinhou o nome da tia e a idade.
Ele, ali, de caneta estendida, a tia vestida de mesa pic-nic e ela com a caneta viajando até ao fim da página.
Está certo!
Aceitou a caneta que o médico petrificado lhe estendia e assinou.